Cobrada na oral da AGU-2023-CESPE:
O incidente de resolução de demandas repetitivas é uma inovação no Código de Processo Civil de 2015. Trata-se de instituto voltado à uniformização de questões unicamente de direito, recorrentes no âmbito dos tribunais intermediários, cuja tese fixada deverá ser obrigatoriamente aplicada em casos presentes e futuros, inclusive no âmbito dos juizados especiais.
Seus requisitos de admissibilidade são a efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito e o risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica.
Há uma grande polêmica doutrinária e jurisprudencial quanto à natureza jurídica desse instituto, sendo certo que parte da doutrina entende que o IRDR tem natureza de procedimentomodelo, enquanto outra parcela entende ter o instituto a natureza de caso-piloto.
O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.798.374, fixou o entendimento de que no IRDR há uma cisão da atividade cognitiva. Em resumo, o órgão julgador do IRDR será competente para, além de fixar a tese jurídica em abstrato, julgar o caso concreto contido no recurso, remessa necessária ou processo de competência originária que originou o referido incidente.
O entendimento fixado aproxima o IRDR daqueles que compreendem o instituto como causa-piloto.
Embora o STJ tenha estabelecido que há uma cisão na cognição quando do julgamento do IRDR entre a fixação da tese e o julgamento do caso concreto, é possível em determinadas circunstâncias que o IRDR aprecietão somente a tese jurídica nele discutida.
Tal situação pode ocorrer na hipótese, por exemplo, de desistência do recurso voluntário interposto pela parte. Nesse caso, o tribunal competente para julgamento do IRDR poderá apreciar tão somente a tese jurídica discutida no caso, independentemente do julgamento do caso concreto que deu ensejo ao IRDR. Nesse caso, aplica-se o art. 976, parágrafo primeiro, do CPC.
Sobre, inclusive, a sua instauração, importante julgado do STJ:
“Não caberá a instauração de IRDR se já encerrado o julgamento de mérito do recurso ou da ação originária, mesmo que pendente de julgamento embargos de declaração.” (STJ, AREsp 140017-SP)
De acordo com a Corte:
“Ademais, o art. 978, parágrafo único, do mesmo Código dispõe que o órgão colegiado incumbido de analisar o mérito do incidente e de fixar a tese jurídica julgará igualmente o recurso que o originou. Por essa razão, a doutrina afirma que o cabimento do IRDR condiciona-se à pendência de julgamento, no tribunal, de uma causa recursal ou originária. Se já encerrado o 13 julgamento, não caberá mais a instauração do IRDR, senão em outra causa pendente; mas não naquela que já foi julgada.”
SISTEMÁTICA DA CAUSA-PILOTO
Inicialmente, cumpre explicar a diferença entre causa-piloto e causa-modelo – com base em questão discursiva da PGM-Fortaleza-CESPE-2017:
No sistema de causa-piloto, o órgão jurisdicional seleciona um caso para julgar e, no exame do caso concreto, fixa o precedente (tese) a ser seguido nos demais. Logo, os recursos repetitivos são processados como causa-piloto (art. 1.036, CPC) e, uma vez julgado o recurso-paradigma (piloto), fixa-se a tese (precedente) para os casos sobrestados. No sistema do procedimento-modelo (causa-modelo), por sua vez, instaura-se um incidente apenas para exame de tese ou questão jurídica que formará o precedente
No IRDR, adotou-se qual sistemática?
De acordo com o STJ, no Informativo 803:
O CPC estabeleceu, como regra, a sistemática da causa-piloto para o julgamento do IRDR. REsp 2.023.892-AP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 5/3/2024.
De acordo com a Corte, o CPC estabeleceu, como regra, a sistemática da causa-piloto para o julgamento do IRDR, que nada mais é do que um incidente instaurado em um processo já em curso no Tribunal para resolver questões de direito oriundas de demandas de massa.
Assim, a adoção da sistemática da causa-modelo não é de livre escolha do Tribunal. Pelo contrário, o Código de Processo Civil a permite em apenas duas hipóteses:
a) quando houver desistência das partes que tiveram seus processos selecionados como representativos da controvérsia multitudinária, nos termos do art. 976, § 1º, do CPC;
b) quando se tratar de “pedido de revisão da tese jurídica fixada no IRDR, o qual equivaleria ao pedido de instauração do incidente (art. 986 do CPC), [caso em que] o Órgão Julgador apenas analisa a manutenção das teses jurídicas fixadas em abstrato, sem qualquer vinculação a qualquer caso concreto” (REsp 1.798.374/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Corte Especial, DJe de 21.6.2022).
No caso discutido, existiu a análise em formato de causa-modelo sem que existisse a presença de uma das duas situações, o que o STJ entendeu que violou o CPC.
De acordo com a Corte, é regra elementar do due process que aquele que não participou do processo – ainda que por intermédio de representante adequado – não pode ser por ele prejudicado.
O IRDR não pode ser interpretado de forma a dar origem a uma espécie de “justiça de cidadãos sem rosto e sem fala”.
Ao adotar o sistema da causa-piloto, a tese repetitiva, da qual surtirão os efeitos externos (erga omnes), deve ser apreciada conjuntamente com o caso concreto, do qual surtirão os efeitos internos (inter partes), como se depreende do parágrafo único do art. 978 do CPC:
“O órgão colegiado incumbido de julgar o incidente e de fixar a tese jurídica julgará igualmente o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária de onde se originou o incidente”.
Se as partes autoras dos processos selecionados não os abandonaram ou deles desistiram, sua efetiva participação é imposição do princípio do contraditório e da norma do art. 978, parágrafo único, do CPC.
RECORRIBILIDADE DO IRDR
É recorrível o acórdão que o admite ou que o inadmite, segundo o STJ?
Não é recorrível. Segundo o Buscador DoD:
É irrecorrível o acórdão que admite ou inadmite o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas – IRDR.
Podem ser apontadas três razões para se defender o não cabimento de recurso nestes casos:
1) o art. 976, §3º, do CPC/2015 afirma que, mesmo depois de o IRDR não ter sido admitido é possível que se requeira a instauração de um novo IRDR, desde que satisfeito o pressuposto que não havia sido inicialmente cumprido, sanando-se o vício existente ao tempo do primeiro requerimento.
2) o CPC só previu recurso contra a decisão que julga o mérito do IRDR;
3) o acórdão que inadmite a instauração do IRDR não preenche o pressuposto constitucional da causa decidida apto a viabilizar o conhecimento de quaisquer recursos excepcionais, pois ausente o caráter de definitividade no exame da questão litigiosa.
STJ. 3ª Turma. REsp 1631846-DF, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, julgado em 05/11/2019 (Info 661).
Cobrada na oral da AGU-2023-CESPE:
De acordo com o REsp 1.798.374, não cabe recurso especial contra acórdão proferido pelo tribunal de origem que fixa tese jurídica em abstrato em julgamento do IRDR, por ausência do requisito constitucional de cabimento de “causa decidida”, mas apenas naquele que aplique a tese fixada, que resolve a lide, desde que observados os demais requisitos constitucionais do art. 105, III, da Constituição Federal de 1988 e dos dispositivos do Código de Processo Civil que regem o tema.
SUSPENSÃO DOS PROCESSO E JULGAMENTO DO IRDR
“A suspensão dos feitos realizada pelo relator ao admitir Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas – IRDR cessa com o julgamento proferido pelo Tribunal de Justiça, com a aplicação imediata da tese ou é necessário aguardar o julgamento dos recursos excepcionais eventualmente interpostos?”
Questão cobrada na oral da PGE-MS-2022.
Espelho:
A suspensão dos feitos no âmbito do IRDR não cessa automaticamente com o julgamento proferido pelo Tribunal de Justiça. O procedimento de suspensão dos feitos no IRDR difere dos recursos repetitivos. (…)
Ademais, com a manutenção da suspensão dos processos pendentes até o julgamento dos recursos pelos tribunais superiores, assegura-se a homogeneização das decisões judiciais sobre casos semelhantes, garantindo-se a segurança jurídica e a isonomia de tratamento dos jurisdicionados. Impede-se, assim, a existência – e eventual trânsito em julgado – de julgamentos conflitantes, com evidente quebra de isonomia, em caso de provimento do REsp ou RE interposto contra o julgamento do IRDR. (Informativo n. 693) REsp 1.869.867/SC, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 20/04/2021
Obs: destaque-se que de acordo com o § 2º do art. 982 do CPC, durante a suspensão, o pedido de tutela de urgência deverá ser dirigido ao juízo onde tramita o processo suspenso.
Outro julgado importante sobre a temática:
Interposto recurso especial ou recurso extraordinário contra o acórdão que julgou o Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva – IRDR, os efeitos deste ficam suspensos enquanto não julgado o recurso excepcional (art. 982, § 5º, do CPC), hipótese em que não cabe reclamação.(STJ, O REsp 1.976.792-RS)
De acordo com a Corte:
“A decisão que não aplica de imediato o comando do IRDR desafiado por apelo especial não ofende a autoridade daquele, uma vez que os efeitos do incidente se encontram suspensos enquanto não julgado o recurso excepcional (art. 982, § 5º, do CPC), ou seja, não havendo IRDR com força obrigatória em vigor, não se estaria diante de nenhuma das hipóteses de reclamação (art. 988 do CPC)”
CABIMENTO DE RECURSO ESPECIAL CONTRA ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TJ COM FIXAÇÃO DE TESE EM ABSTRATO DO IRDR
Decisão muito importante no Informativo 803 do STJ!
De acordo com tal Informativo, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n. 1.798.374/DF, decidiu:
“não cabe recurso especial contra acórdão proferido pelo Tribunal de origem que fixa tese jurídica em abstrato em julgamento do IRDR, por ausência do requisito constitucional de cabimento de “causa decidida”, mas apenas naquele que aplica a tese fixada, que resolve a lide, desde que observados os demais requisitos constitucionais do art. 105, III, da Constituição Federal e dos dispositivos do Código de Processo Civil que regem o tema”.
Nesse caso, foi analisada a admissibilidade de um Recurso Especial da DPDF contra acórdão fundado em pedido de revisão de tese em IRDR, onde, nas palavras do em. Ministro Mauro Campbell Marques, “sequer existe parte contrária e, consequentemente, qualquer espécie de contraditório”.
Concluiu-se, então, que:
“a tese jurídica fixada em abstrato no julgamento do IRDR, ainda que no âmbito da interpretação de norma infraconstitucional federal, não pode ser considerada como causa decidida sob a ótica constitucional, o que somente ocorreria com a aplicação da referida tese jurídica ao caso selecionado para o julgamento ou na aplicação nas causas em andamento/sobrestadas (caso concreto) que versem sobre o tema repetitivo julgado no referido incidente”.
O STJ fez um distinguishing com relação ao caso que vamos agora tratar. Entendeu, então, que:
Cabe recurso especial contra acórdão proferido pelo Tribunal de origem que fixa tese jurídica em abstrato em julgamento do IRDR para tratar de debate acerca da aplicação, em concreto, das regras processuais previstas para a admissão e o julgamento do IRDR.
REsp 2.023.892-AP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 5/3/2024.
O caso discutido aqui é diferente. O que se discute neste feito (e este é o distinguishing em relação ao que restou decidido no REsp 1.798.374 /DF) é a própria admissibilidade e a observância das regras do due process no Incidente instaurado na Corte de origem.
Por se tratar de debate acerca da aplicação, em concreto, das regras processuais previstas para a admissão e o julgamento do IRDR, não haverá outra oportunidade para que as alegações da parte recorrente cheguem ao STJ. Publicada a tese, os casos concretos serão solucionados de acordo com ela, sem possibilidade de novo debate acerca da higidez da decisão do IRDR, que já terá transitado em julgado.
Temos, então, que nos casos de IRDR sem que exista uma causa-piloto:
- quando se pretender discutir a própria tese que foi fixada, não cabe recurso especial;
- quando se pretender discutir as próprias regras processuais utilizadas na admissão/julgamento do IRDR, cabe recurso especial.
RECLAMAÇÃO PERANTE STJ EM FACE DE ACÓRDÃO DE TRIBUNAL QUE DESCUMPRE ENTENDIMENTO FIXADO EM RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO EM FACE DE ACÓRDÃO PROFERIDO EM SEDE DE IR
Cobrado na AGU-2023-oral:
De acordo com a Recl. 43.019, julgada pelo Superior Tribunal de Justiça, é descabida a reclamação ao Superior Tribunal de Justiça com fundamento em inobservância de acórdão proferido em recurso especial em incidente de resolução de demandas repetitivas — IRDR.
Melhor explicando o julgado:
É descabida a reclamação ao Superior Tribunal de Justiça com fundamento em inobservância de acórdão proferido em recurso especial em Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas – IRDR.
Ex: TJ/SP julgou um IRDR; foi interposto recurso especial; STJ manteve o acórdão do TJ/SP; se esse entendimento for desrespeitado, não cabe reclamação ao STJ.
STJ. 2ª Seção.Rcl 43019-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 28/09/2022 (Info 758). Buscador Dizer o Direito.
PROCEDIMENTO DE DISTINÇÃO(DISTINGUISHING) E IRDR
O procedimento de distinção está previsto nos RExt e Especial Repetitivos no art. 1037:
§ 9º Demonstrando distinção entre a questão a ser decidida no processo e aquela a ser julgada no recurso especial ou extraordinário afetado, a parte poderá requerer o prosseguimento do seu processo]
Tal procedimento aplica-se também ao IRDR?
Espelho da oral da PGE-MS-2022:
“O procedimento de distinção (distinguishing) previsto no art. 1.037, §§ 9º e 13, do CPC/2015, aplica-se também ao incidente de resolução de demandas repetitivas – IRDR. (REsp 1.846.109-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 10/12/2019, DJe 13/12/2019). Os recursos especiais e extraordinários repetitivos e o IRDR compõem, na forma do art. 928, I e II, do CPC/2015, um microssistema de julgamento de questões repetitivas, devendo o intérprete promover, sempre que possível, a integração entre os dois mecanismos que pertencem ao mesmo sistema de formação de precedentes vinculantes. “