PREVISÃO LEGAL
Ler o art. 50 do Código Civil, principalmente com as mudanças realizadas pela Lei 13.874/2019 – sempre muito cobradas.
DEFINIÇÃO E CONCILIAÇÃO COM A PERSONALIZAÇÃO DAS SOCIEDADES EMPRESÁRIAS:
“A teoria da desconsideração da personalidade jurídica não é uma teoria contrária à personalização das sociedades empresárias e à sua autonomia em relação aos sócios. Ao contrário, seu objetivo é preservar o instituto, coibindo práticas fraudulentas e abusivas que dele se utilizam. (…) Em virtude de sua importância fundamental para a economia capitalista, o princípio da personalização das sociedades empresárias (…) não pode ser descartado na disciplina da atividade econômica. Em consequência, a desconsideração deve ter necessariamente natureza excepcional, episódica (…). Quer dizer, não se justifica o afastamento da autonomia da pessoa jurídica apenas porque um seu credor não pôde satisfazer o crédito que titulariza. É indispensável que tenha havido indevida utilização, a deturpação do instituto”. (Fonte: Curso de Direito Comercial. Vol. 2: Direito de Empresa / Fábio Ulhôa Coelho – 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 62). – (espelho PGE-BA-2014)
ELEMENTOS SUBJETIVOS E OBJETIVO AUTORIZADORES DA APLICAÇÃO
Pela formulação subjetiva, os elementos autorizadores da desconsideração são a fraude e o abuso de direito; pela objetiva, a confusão patrimonial. (…) Ao eleger a confusão patrimonial como pressuposto da desconsideração, a formulação objetiva visa realmente facilitar a tutela dos interesses de credores ou terceiros lesados pelo uso fraudulento do princípio da autonomia. Entretanto, ressalta-se, ela não exaure as hipóteses em que cabe a desconsideração, na medida em que nem todas as fraudes se traduzem em confusão patrimonial. (Curso de Direito Comercial. Vol. 2. Direito de Empresa / Fábio Ulhôa Coelho – 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 67). (Espelho PGE-BA-2014) )
Obs: Não confundir com a teoria maior e teoria menor.
Teoria maior:
A teoria maior da desconsideração jurídica fundamenta a regra geral adotada pelo art. 50, do CC. Ela se aplica a qualquer pessoa jurídica, desde que esteja presente o requisito do abuso da personalidade jurídica, caracterizado em razão da identificação de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial. O artigo 50, do CC, desde o advento da Lei 13.874/2019, dispõe expressamente acerca do desvio de finalidade e da confusão patrimonial. (espelho PGE-MS-oral-2021)
A teoria menor, adotada no CDC e no Direito Ambiental, exige menos requisitos: sendo ela obstáculo de ressarcimento, já pode ser desconsiderada.
POSITIVAÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO
No direito brasileiro, há menção à teoria da desconsideração da pessoa jurídica no CDC, art. 28, caput e § 5º; na Lei Antitruste, também conhecida como Lei do CADE ou Lei de Defesa da Concorrência (Lei 12.529/2011, art. 34 e parágrafo único); no Código Civil de 2002, art. 50; também na Lei de Crimes Ambientais (Lei 9605/98, art. 4º); e na Lei de Responsabilização Administrativa da Pessoa Jurídica (Lei 12.846/2013, art. 14). (espelho PGE-BA-2014)
EFEITOS QUANTO AO ATO CONSTITUTIVO DA EMPRESA
A aplicação da teoria da desconsideração não implica a anulação ou o desfazimento do ato constitutivo da sociedade empresária, mas apenas a sua ineficácia episódica. (Curso de Direito Comercial. Vol. 2. Direito de Empresa / Fábio Ulhôa Coelho. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 64). (espelho PGE-BA-2014-CESPE)
DESCONSIDERAÇÃO INVERSA
Desconsideração inversa é o afastamento do princípio da autonomia patrimonial da pessoa jurídica para responsabilizar a sociedade por obrigação do sócio. É aplicada, normalmente, no direito de família. (Curso de Direito Comercial. Vol. 2. Direito de Empresa / Fábio Ulhôa Coelho. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 68). (Outros exemplos podem ser citados, não apenas o direito de família). (espelho PGE-BA-2014)
Previsão no CPC:
Art. 133. § 2º Aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica.
Julgado importante sobre desconsideração inversa:
Sócio devedor tem legitimidade e interesse para impugná-la?
De acordo com o STJ(REsp 1.980.607-DF):
O sócio executado possui legitimidade e interesse recursal para impugnar a decisão que defere o pedido de desconsideração inversa da personalidade jurídica dos entes empresariais dos quais é sócio.
De acordo com a Corte, Informativo 744, na desconsideração inversa o resultado do respectivo incidente pode interferir não apenas na esfera jurídica do devedor (decorrente do surgimento de eventual direito de regresso da sociedade em seu desfavor ou do reconhecimento do seu estado de insolvência), mas também na relação jurídica de material estabelecida entre ele e os demais sócios do ente empresarial, como porventura a ingerência na affectio societatis.
Desse modo, sobressaem o interesse e a legitimidade do sócio devedor, tanto para figurar no polo passivo do incidente de desconsideração inversa da personalidade jurídica, quanto para recorrer da decisão que lhe ponha fim, seja na condição de parte vencida, seja na condição de terceiro em relação ao incidente, em interpretação sistemática dos arts. 135 e 996 do Código de Processo Civil de 2015, notadamente para questionar sobre a presença ou não, no caso concreto, dos requisitos ensejadores ao deferimento do pedido.
O encerramento irregular da sociedade é motivo suficiente para desconsiderar a personalidade jurídica?
De acordo com o STJ, não, uma vez que isso não necessariamente gera o preenchimento dos requisitos legais.
O encerramento das atividades ou dissolução, ainda que irregulares, da sociedade não são causas, por si só, para a desconsideração da personalidade jurídica, nos termos do Código Civil.(EREsp 1306553/SC, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 10/12/2014, DJe 12/12/2014)
Fundo de investimento pode sofrer os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica?
De acordo com o STJ(REsp 1.965.982-SP), sim. Veja-se:
Fundo de investimento pode sofrer os efeitos da aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica
De acordo com a Corte, no Informativo 733, o fato de ser o Fundo de Investimento em participação (FIP) constituído sob a forma de condomínio e de não possuir personalidade jurídica não é capaz de impedir, por si só, a aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica em caso de comprovado abuso de direito por desvio de finalidade ou confusão patrimonial.
Membro do Conselho Fiscal pode sofrer os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica?
Se não praticar nenhum ato de administração, não pode, ainda que se aplique a teoria menor. Nesse sentido, o STJ(REsp 1.766.093-SP):
A desconsideração da personalidade jurídica, ainda que com fundamento na Teoria Menor, não pode atingir o patrimônio pessoal de membros do Conselho Fiscal sem que haja a mínima presença de indícios de que estes contribuíram, ao menos culposamente, e com desvio de função, para a prática de atos de administração
De acordo com a Corte, no Informativo 661, a despeito de não se exigir prova de abuso ou fraude para fins sua de aplicação da Teoria Menor, tampouco de confusão patrimonial, o § 5º do art. 28 do CDC não dá margem para admitir a responsabilização pessoal de quem jamais atuou como gestor da empresa.
O que é desconsideração positiva da personalidade jurídica?
Em julgado do STJ(REsp 1514567-SP):
No caso, o que se pretende é o inverso, vale dizer, suspender a personalidade jurídica da sociedade empresarial para se conferir proteção ao devedor que utiliza imóvel de propriedade da empresa como moradia.
Trata-se da denominada “desconsideração da personalidade jurídica positiva”, expressão cunhada pela doutrina para justificar proteção conferida pela Lei n° 8.009/90 a imóvel pertencente à pessoa jurídica, no qual residam os sócios. Sustenta-se que “a teoria da desconsideração da personalidade sempre foi utilizada sob o aspecto negativo (punitivo/repressivo) (…)”, propondo Fábio Ricardo Rodrigues Brasilino seja utilizada também “sob o ponto de vista positivo, ou seja, para resguardo a dignidade da pessoa e outros valores constitucionais” (“A desconsideração da personalidade jurídica positiva”. Revista de Direito Empresarial: ReDE, v. 2, n. 6, p. 91-105, nov./dez. 2014)
Cobrado inclusive no TRF-1a Região-FGV-2023. Veja-se:
A desconsideração positiva da personalidade jurídica é: (A) requerida pelo próprio devedor para conservar seu patrimônio mínimo, notadamente o bem de família que esteja em nome da pessoa jurídica; (B) requerida exclusivamente pelos credores, com base na teoria maior, nos casos em que a inexistência de pessoa jurídica formal (por falta de registro, por exemplo) seja utilizada pelo devedor para ocultar seu patrimônio; (C) requerida exclusivamente pelos credores, com base na teoria menor, nos casos em que a inexistência de pessoa jurídica formal (por falta de registro, por exemplo) seja utilizada pelo devedor para ocultar seu patrimônio; (D) sinônima da desconsideração expansiva da personalidade jurídica, com base na teoria maior, em que o sócio oculto é chamado a responder pelo débito; (E) sinônima da desconsideração expansiva da personalidade jurídica, com base na teoria menor, em que o sócio oculto é chamado a responder pelo débito.
Gabarito: A
Desconsideração da personalidade jurídica e sociedades limitadas modestas
Entendimento importante do STJ:
“Na hipótese em que tenha sido determinada a desconsideração da personalidade jurídica de sociedade limitada modesta na qual as únicas sócias sejam mãe e filha, cada uma com metade das quotas sociais, é possível responsabilizar pelas dívidas dessa sociedade a sócia que, de acordo com o contrato social, não exerça funções de gerência ou administração.(REsp 1.315.110-SE, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 28/5/2013.”
No que consiste a desconsideração expansiva?
Inicialmente, temos que observar a atual redação do parágrafo quarto do art. 50 do Código Civil, modificado com a Lei de Liberdade Econômica:
“§ 4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica”.
Ensinam Pablo Stolze e Rodolfo Gagliano:
“Se, por um lado, a mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos legais não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, por outro, nada impede que, uma vez observados tais pressupostos, o juiz decida, dentro de um mesmo grupo, pelo afastamento de um ente controlado para alcançar o patrimônio da pessoa jurídica controladora que, por meio da primeira, cometeu um ato abusivo.“
Temos, então, que esse tipo de desconsideração da personalidade jurídica entre sociedades é chamado de expansiva.
Os professores citam, ainda, Márcio Souza(Aspectos modernos da teoria da desconsideração da personalidade jurídica. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 64, 1º abr. 2003.):
“A desconsideração da personalidade jurídica para alcançar quem está por trás dela não se afigura suficiente, pois haverá outra ou outras integrantes das constelações societárias que também têm por objetivo encobrir algum fraudador. (…)”
Julgado importante sobre o tema:
Empresa do mesmo grupo econômico e desconsideração da personalidade jurídica
Uma empresa do mesmo grupo econômico da parte executada só pode ter seus bens bloqueados se o incidente de desconsideração da personalidade jurídica for previamente instaurado, não sendo suficiente mero redirecionamento do cumprimento de sentença contra quem não integrou a lide na fase de conhecimento. REsp 1.864.620-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 12/9/2023. Buscador Dizer o Direito.
PRAZOS PRESCRICIONAIS/DECADENCIAIS
O pedido de desconsideração se submete a prazos decadenciais ou prescricionais?
“o pedido de desconsideração da personalidade jurídica, quando preenchidos os requisitos da medida, poderá ser realizado a qualquer tempo, não se submetendo, à míngua de previsão legal, a prazos decadenciais ou prescricionais.”
STJ, AgInt no REsp 2.033.259/PR
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E ASSOCIAÇÃO CIVIL
De acordo com o STJ:
“É admissível a desconsideração da personalidade jurídica de associação civil, mas a responsabilidade patrimonial deve se limitar aos associados em posições de poder na condução da entidade.” (STJ, REsp 1.812.929)
Cobrado na PGE-RN-2024-objetiva.
Pontos importantes na notícia do site do STJ:
“Ao sustentar que a falta de regras específicas não impede a aplicação do instituto no caso em julgamento, Bellizze afirmou que, em se tratando de associação civil, é preciso considerar o número geralmente maior de associados e “a natural dissociação entre a posição de administração da pessoa jurídica e a simples posição de pertencimento a esta, o que acaba por causar grandes embaraços para a incidência da desconsideração de forma simplista”.”
“o mais prudente é a imputação de responsabilidade apenas aos associados que estão em posições de poder na condução da entidade, pois seria irrazoável estender a responsabilidade patrimonial a um enorme número de associados que pouco influenciaram na prática dos atos associativos ilícitos”.